Conheci o trabalho do Bruno Vieira Amaral quando ainda estava a trabalhar no Expresso, no final de 2017, princípio de 2018.
O Zé Cardoso e o Germano falavam dele com frequência e o nome foi-me ficando, bem como os textos/contos que iam aparecendo.
Percebi logo ali que ele escrevia maravilhosamente bem.
Ah, e que escrevia sobre desporto, também.
Em 2020 começou a assinar semanalmente a rubrica “Dejá Vú – o futuro foi ontem”.
Para me preparar para esta entrevista procurei saber um pouco mais sobre este que é mais um dos talentos confirmados da nova geração de escritores portugueses. Vencedor, entre outros, de um Prémio José Saramago – que não é coisa de somenos – do Prémio Fernando Namora e do Prémio TimeOut.
Assim, na semana passada comprei o seu hoje estarás comigo no paraíso e assim que o abri, na primeira folha, deparei-me com isto:
“(…) Porém, bem sei, não são os mortos que falam connosco, nós é que precisamos desesperadamente de os ouvir.
Por mais que gritemos contra o vazio e o esquecimento, a única resposta que temos é o eco do nosso desespero, da nossa vaidade, da nossa arrogância. Não são os mortos que clama por justiça ou vingança. Somos nós que imploramos por sentido, para os nossos mortos não tenham morrido em vão, para que as nossas vidas não nos pareçam tão absurdas.”
Pensei de imediato:
– Prendeste-me, Bruno. Vou ler-te muito em breve. Ai vou, vou.
Mas antes disso, antes disso está isto. Está esta entrevista.
E, porque é a ti que te quero apresentar o Bruno, aqui fica a resposta dele à pergunta habitual. Quem é o Bruno Vieira Amaral?
Sou um escritor português, de 42 anos.
Condições temporárias, exceto a nacionalidade, que não prevejo que me venha a ser retirada nos próximos tempos.

Postas de lado as formalidades informais, aqui fica então a conversa.
Aqui fica o Bruno.
1. Quando é que sentiste que tinhas (e querias) que escrever?
Que querias fazer disto vida. Lembras-te que idade tinhas?
Não sei. Não houve nenhuma epifania. Não fiz planos. Fui aproveitando as oportunidades que me foram aparecendo. E é isso que continuo a fazer.
2. Recordas-te da primeira vez que conseguiste provocar impacto em alguém com alguma coisa que tivesses escrito?
Talvez um texto na primária em que respondi à pergunta “o que é para ti o amor?” com qualquer coisa como “o amor não tem definição.”
As professoras ficaram muito intrigadas com a resposta, desconhecendo que eu a tinha roubado a uma entrevista da Isabel Bahia, então locutora de televisão, à TV Guia.
3. Há quanto tempo escreves profissionalmente?
A primeira vez que me pagaram por um texto foi há onze anos. Senti que estava a enganar alguém porque tê-lo-ia escrito sem mo pagarem.
4. Antes do 1º livro, já escrevias para ganhar a vida?
Era uma das minhas fontes de rendimento, mas não a única, nem a principal. Colaborava em revistas e jornais.
5. Quem foi a tua grande inspiração?
Naquela altura? Ninguém.
6. Tiveste algum mentor? Alguém que possas dizer que é a pessoa responsável por hoje escreveres para “ganhar a vida”?
A pessoa responsável por hoje ganhar a vida a escrever sou eu. O que não significa que não esteja grato a todas as pessoas que, apreciando o meu trabalho, me deram oportunidades para o desenvolver.
Têm sido muitas ao longo destes anos.
A mais importante foi, sem dúvida, o meu editor e amigo, Francisco José Viegas.
7. Já tiveste vontade de parar de escrever e de fazer alguma coisa completamente diferente?
Já, mas depois ganho juízo.
8. Se não fizesses isto da vida, o que é que estarias a fazer agora?
Não faço ideia. Talvez fosse responsável de secção de uma loja da Staples.
9. Qual foi o teu melhor trabalho até hoje? Aquele de que mais te orgulhas.
O meu trabalho mais conseguido foi o meu segundo romance, Hoje Estarás Comigo no Paraíso.

10. Tens, ou já tiveste vergonha de alguma coisa que escreveste?
Não.
11. O que é que gostas mais de escrever? Que formatos é que te deixam mais confortável?
Gosto muito de escrever crónicas, que são muito imediatas. Mas é nos romances que encontro o meu espaço.
12. Por onde é que começas, pelo texto ou pelo título? Porquê?
Sempre pelo texto porque começar um livro pelo título parece-me simplesmente estúpido.
13. Alguma vez fizeste formação para aprender a escrever melhor?
Não.
14. No dia-a-dia, como é que escreves? Tens alguma rotina, ou escreves quando calha?
Escrevo a qualquer hora. Como tenho prazos, não há muito espaço para fantasmas e angústias. Nos romances é um pouco diferente. Escrevo quando me apetece.
15. Como é que reages e lidas com as críticas ao teu trabalho?
Depende das críticas. Quando vêm de semi-analfabetos, não lhes dou importância. A mesma coisa quando o objeto da crítica não é o meu trabalho. Às restantes, tento não atribuir demasiado valor, sejam positivas ou negativas, porque não podem alterar aquilo que escrevi.
16. Recebeste vários prémios pelo teu trabalho. Qual foi o mais especial e porquê?
O mais importante foi o Prémio José Saramago. O que me emocionou mais, pelas circunstâncias em que recebi a notícia, foi o Fernando Namora.
Mas o prémio da revista Time Out é capaz de ter dado um empurrão decisivo ao meu primeiro romance.
17. Acreditas que és bom naquilo que fazes?
Só deves fazer aquilo em que achas que és bom e em que, ao mesmo tempo, sentes que podes melhorar. Se não achas que és bom ou se acreditas que não podes melhorar, então o melhor é mudares de profissão. Quando me sento a escrever, a convicção de que sou bom naquilo que faço não me serve de grande coisa. Ao contrário de um pintor de paredes ou de um carpinteiro, o escritor pode escrever uma grande crónica hoje e amanhã escrever uma crónica que não vale nada. A criação é muito mais do que uma questão de técnica, por isso a solução é escrever cada texto como se fosse o primeiro.
18. Tem, ou já tiveste “bloqueios de escrita”? Se sim, como é que lidas com isso?
Escrevendo.
19. Quem são os teus autores de referência?
Mario Vargas Llosa, Albert Camus, Nelson Rodrigues.
20. Há algum livro de outra pessoa que gostavas de ter sido tu a escrever?
Não. Escrever um livro, um romance, é um processo demasiado ligado ao que sou, em todas as dimensões, para desejar ter escrito um livro que outra pessoa, com tudo aquilo que é, escreveu. Seria o mesmo que desejar ser outra pessoa. E não desejo.
De facto, os escritores são pessoas que admiro muito, mesmo não os conhecendo pessoalmente. Com o Bruno passa-se o mesmo.
Estas entrevistas acabam por me aproximar da forma como pensam e como vêem o mundo.
Obrigado, Bruno.
Pelo teu tempo e pela verdade com que respondeste a tudo e que dá para sentir deste lado do ecrã.
Podes conhecer aqui a obra de Bruno Vieira Amaral e comprar um (ou mais) dos seus livros.
Até para à semana.
No mesmo dia e à mesma hora.